Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Ele, pela sua grande misericórdia, deu-nos uma vida cheia de esperança por meio da ressurreição de Jesus Cristo.
(I Pedro 1:3)
Praticamente, toda a gente celebra, de uma forma ou de outra, o domingo de Páscoa, independentemente das suas convicções religiosas, do seu background cultural ou social, ou da visão que tem do mundo. Porém, nem toda a gente conhece o seu verdadeiro significado e muito menos gente vive este dia como deveria, como aquele que acorda na manhã desse domingo, exclamando ou publicando: “O túmulo está vazio! Jesus ressuscitou! Aleluia!”.
Quando alguém deseja a outrem “Feliz Páscoa!” ou,
no dia seguinte, lhe pergunta se teve uma “boa Páscoa”, o que é que poderá condicionar
a resposta daquele que é contemplado pela simpatia de quem o interpela? Devemos
concordar que tudo dependerá da sua “situação”, do estado da sua alma, da
vivência de um passado recente ou dos contornos que a perspetiva de um futuro
próximo apresenta. Se pensarmos apenas na vida mundana, na tradicional vivência
deste período do ano, então a resposta emocional a este desejo será, com grande
probabilidade, dependente da vida que a pessoa está levando. Se a vida lhe
estiver a correr bem, com saúde, relacionamentos sociais gratificantes, família
unida e numerosa, condição material confortável, etc., então não haverá motivos
para achar que a “sua” Páscoa não se apresenta “feliz” ou “boa”. Ou seja, o
fator que determina o sentimento de felicidade do tempo que atravessa não será
tanto o que esse tempo significa na verdade, mas sim a sua própria vida, o seu
estado interior ou exterior. E estes são alguns dos motivos pelos quais as
pessoas, em geral, respondem às saudações que lhes dirigem de uma forma
autocentrada, como, por exemplo, “sim, obrigado, na medida do possível!”,
ou, “para os tempos que correm, com estas limitações todas que nos foram
impostas, até que podia ter sido pior!”; ou até “desde que haja saúde!..
Isso é o que mais importa!”. E nós perguntamos: “mas então, o que é que
a saúde, as condições sociais e económicas, as decisões do governo, ou as
iguarias servidas à nossa mesa, têm a ver com a forma mais ou menos “feliz” ou “boa”
como vivemos a Páscoa?”. Tudo depende da resposta que dermos à pergunta “Tu
crês?”. Se ela for “Eu creio!”, então uma coisa não terá a ver com a
outra.
A pessoa que afirma “Eu creio!” é alguém
que não só crê que Deus encarnou em Jesus, que Jesus viveu, como homem, entre
nós, que “foi entregue conforme o plano previsto na
sabedoria de Deus” (Atos 22:23) e que “Deus
o ressuscitou livrando-o do poder da morte, porque não era possível que ele
fosse dominado por ela.” (Atos 22:24), como também o faz
porque recebeu Jesus Cristo como seu Senhor e seu Salvador, sendo este facto
mais que suficiente para que ela tenha ganho uma razão para a sua esperança.
O apóstolo Pedro, falando na primeira pessoa do plural, escreveu, na sua primeira carta, “[...] Deus, [...], pela sua grande misericórdia, deu-nos uma vida cheia de esperança por meio da ressurreição de Jesus Cristo” (I Pedro 1:3). Mantendo a pessoa e número gramaticais, podemos dizer que, se Deus nos deu, tal como aos primeiros destinatários da sua carta (cristãos espalhados por várias partes do mundo conhecido até então), “uma vida cheia de esperança”, ressuscitando o seu Filho, Jesus Cristo, não será de estranhar que este tempo de Páscoa seja por nós vivido de uma forma que é totalmente independente das circunstâncias da vida de cada um, da conjuntura espacial ou temporal em que nos encontramos, inundado que estamos pela alegria que brota de uma fonte pura e verdadeira, que é o Jesus ressuscitado, o Jesus que vive, que reina e que um dia voltará. E é esta esperança que marca a diferença, pois é algo que “herdámos” dos primeiros apóstolos: embora não de forma ocular, nós somos também chamados a ser, enquanto parte integrante da Igreja de Cristo, “testemunhas da ressurreição”.
Como bem lembrou o Pastor Eduardo Conde no episódio de abril de 2021 do “Igreja em Missão”, o facto de sermos testemunhas da ressurreição do Senhor não significa que somos chamados a provar que a ressurreição de Cristo ocorreu de facto, ou que Deus existe, mas significa afirmarmos a nossa fé no Cristo crucificado e ressurreto, vivermos de acordo com essa afirmação e “colocarmos todas as coisas debaixo do olhar d’Aquele que ressuscitou e é o Senhor das nossas vidas”.
A Ressurreição de Jesus é, pois, um acontecimento que fundamenta a fé daquele que diz “Eu creio!”, pois, se Cristo não tivesse ressuscitado, seria vã a pregação da Igreja, seria vã a nossa fé e ainda permaneceríamos nos nossos pecados (cf. I Coríntios 15;14, 17), escravizados por eles e pelas suas consequências. Não conheceríamos a verdade e não seriamos livres para realizarmos aquilo para o qual fomos criados: dar glória a Deus (cf. João 8:32).
O Bispo Sifredo Teixeira, no seu sermão de domingo de Páscoa, na Igreja do Mirante, lembrou que, “se não tivesse ocorrido a Ressurreição, nunca teríamos ouvido falar de Jesus, nunca teriamos ouvido a Palavra da salvação, nunca teríamos sido salvos pela sua graça, nem beneficiados pelo seu amor e pela sua presença viva entre nós!”.
A Ressurreição foi, de facto, o evento que mudou o mundo, de forma radical e para sempre, pois permitiu o encontro com o Cristo ressuscitado, vivo e glorificado. Veja-se o caso daquelas mulheres que, segundo os relatos bíblicos, caminharam alguns quilómetros, de Betânia a Jerusalém, na madrugada do primeiro dia da semana após o sepultamento de Jesus, para cuidarem do seu corpo inanimado sem sequer saberem como iriam conseguir remover a pedra, selada, do seu túmulo (cf. Mateus 27:66; Marcos 16:1-4)! Na verdade, Deus tem o poder de conseguir, para nosso benefício, aquilo que nunca conseguiríamos com o nosso próprio esforço; e o túmulo vazio, com a pedra, que servira de porta, removida, lembra-nos isso mesmo.
Segundo palavras do Pastor João Vilaça no episódio do “Igreja em Missão” atrás referido, as primeiras testemunhas da ressurreição, “depois de terem sentido medo, desalento e falta de esperança, passaram, pelo poder do Cristo ressuscitado, a ter coragem para pregar a boa notícia, apesar de sofrerem perseguições e morte”. Referiu também, no mesmo programa, que “a ressurreição, apesar de estar intimamente ligada à vida eterna, tem um impacto profunda no tempo presente; é uma esperança viva e vivida, que traz consolo à vida das pessoas, perante as imensas adversidades que atravessam”.
Esse impacto no presente foi também realçado, nesse
programa, pela Pastora Maria Eduarda Titosse, da Igreja Evangélica
Presbiteriana de Portugal, que referiu que “o conhecimento do nosso fim
último permite-nos moldar o nosso presente e agir em conformidade, perante tudo
o que enfrentarmos. Essa esperança [que nos é dada “por meio da
ressurreição de Jesus Cristo”] é muito importante, pois ela permite-nos
saber que nunca estamos sozinhos nesta nossa vida presente, nos bons e nos maus
momentos ou nas nossas decisões”.
Ouvimos dizer, não raras vezes, “eu espero que me aconteça isto ou aquilo” ou outras frases do género, sugerindo que a pessoa espera que algo vá acontecer, no futuro, mas não está certo de que esse algo vai mesmo acontecer. Mas quando falamos de “esperança”, como aquela que nos traz a ressurreição de Cristo, o significado é diferente. A esperança que é gerada em nós pelo poder do Espírito Santo é algo que não nos desaponta, pois trata-se da absoluta certeza de que Deus fará e cumprirá, no futuro, tudo aquilo que Ele prometera. O crente não nasce de novo para uma esperança qualquer, mas sim para uma esperança viva e eterna, que não pode ser separada da Ressurreição de Jesus; porque essa esperança é fundamentada no facto de que, quando Deus levantou o Seu Filho dos mortos, ele fê-lo por Jesus ser o primogénito de muitos, de todos aqueles que foram ou serão tornados filhos de Deus por adoção, e que estes participarão da vida de Jesus quando chegar o tempo em que também forem ressuscitados dos mortos, sendo-lhes assim concedido o benefício de uma vida que dura para sempre, de uma vida eterna, alimentada continuamente pelo poder do Cristo ressurreto (cf. Romanos 8:11)
Se esperamos a ressurreição do corpo e a vida eterna, então aquilo que temos é a ESPERANÇA no seu verdadeiro significado. É por isso que o cristão sabe que não é a fome ou a miséria, a violência, o Covid-19, a perseguição por motivos religiosos, as doenças terminais, os desastres naturais, e outros fatores maléficos que poderão levá-lo ao desespero ou à lamentação constante, ou que terão a última palavra, mas sim Jesus Cristo, agindo por meio do Espírito Santo. Por isso é que, como cristãos, somos chamados a manter essa esperança na ressurreição e na vida eterna, até porque “a verdade é que Cristo ressuscitou dos mortos, e é garantia de ressurreição para os que morreram.” (I Coríntios 15:20, BpT).
O teólogo batista, brasileiro, Franklin Ferreira (1970 - ...) refere, na obra que escreveu sobre o Credo dos Apóstolos, o seguinte: “Confessamos crer na ressurreição de Jesus Cristo e, agora, esperamos a ressurreição dos nossos que creram em Cristo e a nossa própria ressurreição. A criação será renovada. Cristo ressuscitou. Portanto, temos uma grande esperança, a esperança do triunfo final.”[1]
Este triunfo é de Jesus, pois ele próprio, na última conversa que teve com os seus discípulos antes de ser entregue às autoridades, disse-lhes “Tenho-vos dito isto, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas, tende bom ânimo, eu venci o mundo.” (João 16:33). Mas, sendo de Jesus esse triunfo, daquele que nos amou e nos ama, ele é também nosso, pois (parafraseando Jesus) “se eu venci, também vós podereis vencer!”. E Ele diz-nos hoje “se eu ressuscitei, também vocês ressuscitarão!”, pelo que podemos “cantar vitória”, tal como fez o apóstolo Paulo quando escreveu aos Romanos: “Mas, em todas estas coisas, somos mais do que vencedores, por aquele que nos amou” (Romanos 8:37). Ou o apóstolo João, na sua primeira carta: “Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé.” (I João 5:4).
Recordemos mais algumas palavras que o Pastor Eduardo Conde nos deixou no já mencionado episódio do “Igreja em Missão”: “A Ressurreição de Cristo abre, para todo aquele que crê, uma perspetiva de eternidade, de uma vida que não se esgota no mundo real tal como o conhecemos, percebendo que a nossa origem está em Deus e que o nosso fim último também está em Deus (não sendo a morte, mas a vida que em Deus existe). Ora, tudo isto traz um horizonte de esperança que ultrapassa as circunstâncias da vida que temos, pois, por Cristo e em Cristo, nós temos vida, e vida abundante. E que nos faz em tudo dar graças. [...] Perante a Ressurreição de Jesus não nos devemos limitar a acreditar e a contemplar e admirar esse mistério, mas sim regozijarmo-nos e alegramo-nos, por podermos – TAMBÉM NÓS! – ressuscitarmos em Cristo. [...] Nós estamos seguros de que estamos a percorrer um caminho que já foi aberto e percorrido; nós fazemos caminho colocando os nossos pés nas pegadas d’Aquele que, antes de nós, fez esse caminho e chegou onde nós queremos chegar e é para onde Ele nos quer levar, e isso dá-nos uma confiança extraordinária.”
O projeto “Missão Creio”, da Igreja Evangélica Metodista Portuguesa, procura, entre outros aspetos, incentivar os crentes a serem verdadeiras testemunhas da ressurreição, e isso passa por partilhar, seja com quem for e onde for, a experiência da sua transformação pessoal; significa contar a história da melhor coisa que alguma vez lhe poderia ter acontecido: aquilo que Cristo fez na sua vida e com a sua vida... e continua a fazer!
Que a Paz do Cristo ressuscitado esteja com todos!
Diácono Alfredo Bastos Silva
[1] “O Credo dos Apóstolos – As Doutrinas Centrais da Fé Cristã” (Fiel Editora, 2015)
Nota: as citações de palavras proferidas pelos Pastores Eduardo Conde e João Vilaça, da Igreja Evangélica Metodista Portuguesa (IEMP), e da Pastora Eduarda Titosse, da Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal (IEPP), sãp parte das suas participações no episódio nº 6 da terceira temporada do programa “Igreja em Missão”, publicado em 6 de abril de 2021, no canal YouTube da IEMP, e dedicado ao tema “Creio... Esperança na Ressurreição”. Os episódios deste programa, que é parte integrante do projeto “Missão Creio”, da IEMP, estão a ser publicados nas primeiras terças-feiras de cada mês.